Hora da consequência
Igreja Matriz de São Luis do Paraitinga em junho de 2009 e depois da enchente
2010 chegou trazendo prelúdios de um futuro nada otimista por todo o mundo. O Brasil, muitas vezes chamado de terra sagrada por não sofrer com fenômenos naturais como terremotos e tornados, acabou também atingido pelo desequilíbrio por qual passa o meio-ambiente de todo o planeta. Hoje escrevo em primeira pessoa, pois as notícias que para muitos não passaram da televisão, para mim ressoaram muito próximas.
Surge uma certa noção de responsabilidade quando os caminhos que se trilhou há poucos meses de repente são inundados por infindáveis metros de água, surge um senso de dever quando os rostos que se viu e a vida que se presenciou se perdem debaixo de um rio. Essa foi apenas uma tragédia. A outra, ocorrida em Ilha Grande, me deixou sem uma amiga da melhor época da vida. Mas vou falar de chuvas e enchentes.
Tive a oportunidade de estar em São Luis do Paraitinga em junho de 2009 e, como todo jornalista, não perdi a chance de documentar a visita. A igreja que agora não passa de escombros eu havia fotografado com grande interesse. A praça, as casas, e o rio. É dolorosamente estranho ver as ruas por onde se passou surrealisticamente submersas.
Estive de passagem na região de Angra dos Reis em dezembro e, com muita chuva, o que vi foi assustador. As paredes de terra dos morros que emolduram toda a Rio-Santos estavam literalmente se diluindo, pequenas cachoeiras se formavam em toda a extensão do caminho, em alguns trechos havia correntezas de água laranja do barro, escorrendo caminho a baixo, lá onde os primeiros metros da água do mar estavam todos tingidos da mesma cor. Bairros inteiros sob o mesmo líquido barrento e a chuva pesada e incessante.
Fora esses dois locais, há hoje a extrema vulnerabilidade da cidade de São Paulo às chuvas, os estragos em Santa Catarina, as cidades cujas ruas começam a se encher de água com uma velocidade nunca antes vista quando há chuva.
Daqui e de outros lugares onde as catástrofes naturais estão destruindo vidas, a mensagem está muito clara. Chega a hora das consequências.
Senhores governantes, dirigentes, representantes, embaixadores, diplomatas, políticos, industriais, empresários, chegou a hora de pagar pelos excessos cometidos. Talvez, de onde estavam quando houve a oportunidade de tomarem uma atitude, não puderam enxergar o que se passa no planeta; talvez estejam míopes, mais provavelmente loucos. Se tiverem a ilusão de que as enchentes, os dilúvios e o superaquecimento se limitarão às fronteiras de outros países que não os seus, então estão mesmo loucos.
Não há política que negocie os imperativos da natureza, sabiam? Não acreditem que conferências, acordos, sanções ou armas nucleares possam dar ordem à chuva para deixar de chover ou ao vento para parar de ventar. Muito menos trarão de volta as vidas roubadas. Se toda essa irresponsabilidade e indiferença como a que vimos em Copenhague se explica pela ambição por lucro e poder, que tentem usar do dinheiro para barganhar de volta a vida e o tempo perdidos. Esses dois não há como tornar moeda de troca.
Se aquele que está num lugar de liderança não prioriza a vida e a continuidade desta, então é um criminoso, não um líder. O problema ambiental é global, não é 20% responsabilidade deste ou 4% daquele. Não é comensurável em lastro, não é previsível, não é reversível. Exige comprometimento geral. E urgente.
- Os moradores de São Luis do Paraitinga estão isolados e necessitam de ajuda. Os quartéis da Polícia Militar de todo o estado de São Paulo estão recolhendo doações como água, colchões, roupas e alimentos.
Por Maricy Ferrazzo
Por Maricy Ferrazzo
Fotos (respectivamente): Myfzz e Estadão - Sérgio Neves/AE
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