sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

HISTÓRIA

O mistério da “Praga da Dança” de 1518


Absolutamente curioso o livro do historiador americano, John Waller, sobre uma praga que teria acometido a população de Estrasburgo, então parte do Sacro Império Romano-Germânico, no ano de 1518, e levado muitos à morte. Porém, diferentemente das doenças que infestavam as sociedades da época, como a sífilis, a lepra ou tipos de febres mortais, a praga que acometeu os alsacianos se manifestou em forma de dança, ou seja, fazendo com que as pessoas dançassem sem parar, até a exaustão e consequentemente a morte.

Muito embora a história pareça material típico de lendas ou contos de fadas (Hans Christian Andersen escreveu sobre uma menina que não parou de dançar até que providenciou a amputação dos próprios pés no conto Os Sapatos Vermelhos), o historiador reuniu em sua obra uma pesquisa que expõem fatos e evidências na tentativa de comprovar a ocorrência da história.

Aparentemente, as danças involuntárias seriam manifestação em grupo de um histerismo gerado pela fome e outras privações ocasionadas por um período de baixas na agricultura e outros problemas de organização política e econômica. O frenesi dançante desses camponeses ficou conhecido por "A Dança de São Vito", iniciado com uma mulher chamada Troffea, que teria começado a dançar freneticamente na rua, no dia 14 de julho do ano mencionado, e permanecido nessa atividade por dias, mesmo com os sapatos encharcados de sangue e contra a própria vontade. Até o fim daquela semana outras 34 pessoas teriam se juntado a ela. Até o final do mês o total seria de 400 pessoas, transformando o ocorrido numa epidemia que matou por exaustão, ataque cardíaco ou desidratação.

Há teses que explicam a praga da dança como originada pela ingestão de uma espécie de fungo que se desenvolve no centeio mofado, e que libera Tartarato de ergotamina, substância componente do ácido lisérgico ou LSD. Entretanto, Waller discorda dessa explicação, afirmando que tal substância poderia causar reações alucinógenas, mas não colocar um grupo inteiro de pessoas a realizar movimentos coordenados, uma dança propriamente dita.

Mesmo com estudos voltados a explicar essa manifestação de horrores do século XVI, ainda assim permanece o mistério acerca desse fenômeno de 500 anos, que o livro de Waller, A Time to Dance, A Time to Die: The Extraordinary Story of the Dancing Plague of 1518 (Icon Books, 2008) propõe explicar. Que a praga da dança realmente aconteceu é fato registrado e documentado, o difícil é elucidar como camponeses esfomeados, mesmo no caso de histeria coletiva, teriam forças para terem permanecido por dias em constante atividade física. Há, inclusive, uma corrente supersticiosa sobre o caso: existem relatos de que o corpo de Frau Troffea teria continuado a dançar mesmo depois de sua morte, e que a Praga de São Vito era enviada às populações descrentes e blasfemas.

Na cultura medieval europeia existe universalmente a alegoria conhecida por Danse Macabre, uma narrativa do poder da morte, personificada como superior às distinções de classe, infalível. A parábola foi constantemente ilustrada no período e era utilizada como um memento mori ou também como sermão religioso. De qualquer forma, o relato de Estrasburgo sobre uma epidemia de dança involuntária não é o único nem ocorreu somente no continente europeu (ela teria se repetido ainda no século XVI na Bélgica e Holanda), tendo acontecido igualmente em 1840, em Madagascar, e em 1963 na Tanzânia.

Contaminação, histerismo ou castigo sobrenatural, o caso de Estrasburgo é mais um mistério histórico especialmente interessante, pois, nas deduções que desperta, se posiciona exatamente na linha entre o céu e a terra a que Shakespeare aludiu.

Por Maricy Ferrazzo

Fontes: G1
thepsychologist.org.uk Dancing Plagues and Mass Hysteria.
Wikipédia.com

Images: Detalhe de The Dancing Plague, Peter Brueghel, 1564.
Icon Books

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